LHC está entrando em região nunca antes explorada


O Castor, que faz parte do LHC, foi um dos detectores que teve participação de brasileiros na criação
Foto: Cern/Divulgação

Angela Joenck Pinto

O projeto do maior instrumento científico já construído, o acelerador de partículas LHC (Large Hadron Collider, ou grande colisor de hádrons) conta com a participação de diversos pesquisadores brasileiros. Segundo eles, apesar de ainda estar em uma fase inicial, o acelerador já teve resultados surpreendentes e está entrando num campo nunca antes investigado na prática.

"É uma região de energia que a gente nunca explorou em laboratório. Nós nunca fizemos esses tipos de reações em condições controladas. E o fato de a gente conseguir fazer isso já é um grande feito, já é uma grande conquista", diz Jun Takahashi, professor do Instituto de Física Gleb Wataghin, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

"Para você ter uma ideia, a gente tem milhões de eventos, milhões de colisões acontecendo, e nós medimos e fotografamos elas. E vamos estudando. A medida que aprendemos, publicamos artigos. Então estamos reunindo informações especificas do que está acontecendo nessas colisões, para tentar entender um pouco melhor o que acontece no mais fundamental da matéria. Mas o principal, para nós, foi mesmo a oportunidade de verificar o intenso envolvimento da nossa equipe e oferecer uma experiência única de formação para nossos alunos", afirmou.

Dividido entre seis grandes experimentos, o LHC estuda partículas fundamentais dos átomos e ajudará no entendimento do universo. Entre os objetivos, está o de registrar pela primeira vez a chamada "partícula de Deus", o bóson de Higgs, um dos componentes do átomo.

"No LHC você tem dois feixes de partículas sendo aceleradas, uma girando num sentido horário, outra no sentido anti-horário, e eles colidem para criar as reações de partículas", diz Takahashi, que está envolvido no experimento Alice.

"O projeto Alice é grande, gigante na verdade, com milhares de detectores. É uma colaboração de mais ou menos mil pesquisadores com vários detectores, e dentre eles temos os brasileiros participando deste experimento", afirma.

Segundo o professor, foi o próprio Cern - a Organização Européia de Pesquisa Nuclear, responsável pelo LHC - que convidou os brasileiros para participarem do projeto. "Ninguém se ofereceu, nós na verdade fomos convidados por eles a participar desse experimento, porque a gente já trabalhava em outro projeto nos Estados Unidos e eu, por exemplo, tenho vários artigos publicados na área, então o pessoal da Europa achou que seria interessante que o nosso grupo entrasse no experimento, porque a gente poderia colaborar", diz Takahashi, que viaja até as instalações do projeto com frequência para coordenar o trabalho e elaborar reuniões com seu grupo de pesquisa.

"Eu tenho parte da minha equipe que fica lá, passa períodos de três a seis meses, volta e depois vai novamente. Para pagar as nossas viagens e as bolsas dos nossos alunos, contamos com as agências de fomento, como a FAPESP, no caso dos estudantes de São Paulo, e o Ministério de Ciência e Tecnologia".

Experiência semelhante teve o pesquisador do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF) Gilvan Augusto Alves, participante do projeto CMS (sigla em inglês para Solenoide de Múon Compacto). "O CBPF já participava, desde 1991, de um projeto semelhante nos Estados Unidos, no acelerador de partículas do Fermilab, em um experimento chamado D0. Por esse motivo, fomos convidados, em 2003, a participar na fase final de construção do CMS".

O experimento conta hoje com mais de 3 mil pesquisadores e estudantes de pós-graduação e consiste em um conjunto de detectores que medem as propriedades físicas, como momentum e energia, das centenas de partículas produzidas em colisões de prótons contra prótons em seu interior.

"O experimento CMS começou a ser construído por volta de 1998. Quando nosso grupo iniciou os trabalhos em 2003, boa parte dos detectores já havia sido construída ou estava em construção. Por esse motivo, trabalhamos inicialmente na finalização de alguns detectores de partículas, como o detector Castor, que mede a energia de partículas produzidas a baixos ângulos, e também na elaboração de software para a monitoração dos dados produzidos nas colisões próton-próton", explica Alves.

Atualmente, o grupo está envolvido tanto na elaboração de softwares para a monitoração dos dados como na coleta de informações junto ao experimento CMS no LHC, através de visitas periódicas ao Cern. "Também temos um projeto, aprovado pela Finep, para a construção de mais um detector de partículas semelhante ao Castor", diz.

Resultados inesperados

O CMS começou a sua coleta de dados na máxima energia do LHC - 7 trilhões de elétrons-Volt (7 TeV) - em 30 de março. "Deve-se ter em mente que um experimento com essa complexidade demora vários meses somente na fase de calibração dos detectores. Mas mesmo com o curto tempo desde o início, uma série de resultados interessantes e até inesperados já foram produzidos", diz o pesquisador.

Ele cita a observação, divulgada no mês passado, de uma correlação angular de longa distância entre partículas produzidas em colisões de alta multiplicidade, com mais de 110 partículas em uma colisão.

Um tipo de correlação semelhante só havia sido observado antes em colisões de íons pesados no acelerador RHIC, o Colisor Relativístico de Íons Pesados, mas nunca em colisões próton-próton. "O que esperamos agora é observar partículas ainda não vistas, como o bóson de Higgs, e quem sabe novos fenômenos, para os quais teremos que descobrir sua origem e interpretação", completou Alves.

Longe do cinismo natural da ciência, o professor Takahashi, do projeto Alice, confessa que só o fato de ser possível reproduzir os experimentos em laboratório já é algo surpreendente.

A partícula de Deus

O físico britânico Peter Higgs postulou há mais de 40 anos a existência de uma partícula que explicaria a existência de massa nos átomos. Ele não gosta do termo "partícula de Deus" , pois tem medo de que algumas pessoas se sintam ofendidas. A expressão foi cunhada pelo Nobel de Física Leon Lederman, que disse que a sua descoberta unificar a compreensão da física de partículas e ajudar os seres humanos a "conhecer a mente de Deus".

O próprio Higgs já afirmou que espera que a partícula seja registrada pela primeira vez em breve. Contudo, o próprio físico britânico disse anteriormente que ficaria "muito, muito intrigado", caso a existência da partícula jamais venha a ser provada, porque ele não consegue imaginar o que mais explicaria a massa das partículas.
Fonte: http://noticias.terra.com.br
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