Guerra Regional Ameaça o Mundo

Ao elaborar modelos climáticos em computadores modernos, não só provamos que as ideias da década de 80 estavam corretas, como seus efeitos se fariam sentir durante pelo menos dez anos, muito mais que o previsto anteriormente. Por meio de cálculos que avaliam décadas inteiras e incluem os oceanos e toda a atmosfera – empreendimento viável graças aos velozes supercomputadores – constatamos que até a fumaça de uma remota guerra localizada seria aquecida e suspensa pela ação do Sol. As partículas permaneceriam durante anos na atmosfera superior, bloqueando a luz solar e, consequentemente, esfriando a Terra.

Atualmente, a Índia e o Paquistão podem ser os adversários mais preocupantes, capazes de detonar um conflito nuclear regional. Juntos, detêm mais de 100 bombas. E há outros países bem equipados, além dos Estados Unidos e da Rússia (que têm milhares de ogivas): China, França e Reino Unido dispõem de centenas dessas armas; Israel tem mais de 80; a Coreia do Norte, cerca de dez; e o Irã pode estar tentando fabricá- las. Em 2004, esse panorama levou Owen Brian Toon, um dos autores deste artigo, e mais tarde Rich Turco, da University of California, Los Angeles, ambos veteranos das investigações dos anos 80, a computar os possíveis efeitos ambientais globais de um confronto localizado. Como estudo de base, eles utilizaram uma hipotética agressão indo-paquistanesa.

De acordo com as estimativas mais recentes de David Albright, do Instituto para Ciência e Segurança Internacional, e de Robert S. Norris, do Conselho de Defesa dos Recursos Naturais, a Índia tem entre 50 e 60 armas operacionais (com plutônio suficiente para 100) e o Paquistão, 60. Os dois países continuam a expandir seus arsenais, e seus testes nucleares indicam que a potência destrutiva das ogivas seria semelhante aos 15 quilotons (equivalente a 15 mil toneladas de TNT) da bomba lançada pelos Estados Unidos sobre Hiroxima.

Toon, Turco e Charles Bardeen, do Centro Nacional para Pesquisa Atmosférica, projetaram o que aconteceria se 50 bombas de Hiroxima fossem detonadas contra alvos nas áreas mais densamente povoadas do Paquistão e outras 50 atingissem a Índia. Algumas pessoas insistem que o uso de armas atômicas seria cirúrgico e moderado. Mas na esteira do subsequente caos e terror, e com as comunicações interrompidas, é duvidoso que os líderes limitem seus ataques de modo racional. Essa probabilidade é particularmente verdadeira para o pequeno Paquistão, que poderia ser rapidamente invadido em um conflito convencional. Peter R. Lavoy, da Naval Postgraduate School, por exemplo, ao analisar como poderia ocorrer um enfrentamento indo-paquistanês, argumenta que o Paquistão talvez seja obrigado a tomar uma decisão rápida e empregar todo seu arsenal atômico antes que a Índia ataque suas bases militares com forças tradicionais.


Evidentemente, esperamos que o número de alvos nucleares em qualquer guerra futura seja nulo, mas tanto os políticos como os eleitores devem saber o que é possível. Toon e Turco concluíram que mais de 20 milhões de pessoas poderiam morrer nos dois países em consequência das explosões, dos incêndios e da radioatividade – uma terrível carnificina. Eles também ficaram chocados ao constatar que isso geraria um tremendo volume de fumaça, considerando as megacidades nos dois países. Cada incêndio calcinaria uma área idêntica à que devastou Hiroxima, levando-se em conta a quantidade de material inflamável existente por pessoa. Com base em diversos estudos eles calcularam que as 50 bombas hipotéticas detonadas no Paquistão produziriam três teragramas de fumaça e as ogivas lançadas sobre a Índia, quatro teragramas (1 Tg corresponde a 1 milhão de toneladas).

Observações por satélite de incêndios florestais reais mostraram que a fumaça pode se elevar acima da troposfera (a camada inferior da atmosfera) e, às vezes, penetrar na estratosfera inferior (a camada imediatamente acima, que se estende por cerca de 48 km). Toon e Turco ainda fizeram alguns cálculos rápidos, com números aproximados, do possível impacto climático, caso a fumaça entre na estratosfera. A magnitude desses efeitos os levou a compreender que necessitavam da ajuda de um modelador climático.

Como se constatou, Robock já estava trabalhando com Luke Oman, do Centro de Voos Espaciais Goddard, da Nasa, que estava prestes a concluir seu Ph.D. na Rutgers University sobre os efeitos climáticos de erupções vulcânicas, e Georgiy L. Stenchikov, também da Rutgers, um dos autores do primeiro estudo russo sobre um inverno nuclear. Eles criaram um modelo climático que poderia ser aplicado de modo relativamente fácil para os cálculos das explosões atômicas.

Sendo conservadores, Robock e seus colegas utilizaram 5 Tg de fumaça em sua projeção da estratosfera superior sobre a Índia e o Paquistão, na data imaginária de 15 de maio. O modelo calculou como os ventos dispersariam a fumaça ao redor do globo e como as partículas de fuligem decantariam da atmosfera. A fumaça cobriu todos os continentes em duas semanas. O vapor negro e fuliginoso absorveu luz solar, esquentou e, consequentemente, subiu até a estratosfera. Como ali jamais chove, o ar nunca é purificado. E, por serem microscópicas, com um diâmetro de apenas 0,1 mícron (mm), as partículas de fuligem precipitam muito lentamente devido à resistência do vento. Mas durante o dia elas voltam a subir à medida que são aquecidas pelo Sol, criando um ciclo repetitivo que retarda sua eliminação. Os cálculos revelaram que a fumaça penetraria muito mais na estratosfera superior que as partículas de sulfato produzidas em ocasionais erupções vulcânicas. E, como são transparentes e em geral maiores que as de fuligem, medindo cerca de 0,5 mm, elas absorvem muito menos luz solar. Partículas vulcânicas permanecem suspensas durante aproximadamente dois anos, mas a fumaça de incêndios atômicos perduraria uma década.


Fonte: http://www.uol.com.br
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